BIOSSÍNTESE MORFOANALÍTICA
GESTALTEN BIOLÓGICAS EXISTENCIAIS
Palavra chave: Psicologia da Gestalt, Psicobiologia, Psiconeuroembriologia, Psicofisiologia, processo terapêutico, ciência e existencialismo.
J. Evilázio Lima
Conforme teorias científicas mais recentes, nós, seres humano, chegamos à nossa forma atual a partir da função e desenvolvimento de vários microorganismos existentes no “caldo” da terra primitiva, há aproximadamente bilhões de anos atrás.
Chegou-se à conclusão que, sob as influências de radiações cósmicas e intensas variações climáticas do nosso planeta em evolução, ocorreram grandes alterações físico-químicas nesta atmosfera primitiva, com o consequente surgimento das primeiras formas orgânicas (Alexander Oparin, 1936).
Estas bases da vida biológica (micróbios, vírus e outros pequenos seres) sofriam constantes mutações por modificações átomos-moleculares, culminando com advento do DNA, entendido hoje como repositório da vida biológica e da manutenção das espécies, assim a vida foi capaz de evoluir mesmo diante das intempéries ambientais.
Surgiram, então, os primeiros grupos e classes de seres vivos que, apesar de comportamentos similares (absorção e excreção) diferenciam-se quanto à forma e modo funcional, para sobrevivência, formando então, as primeiras colônias.
Deste continuum primordial da existência derivaram agregados mais complexos, e estes passaram a ser entendidos como os responsáveis pela junção simbiótica.
Este fenômeno ocorreu quando grupos que apresentavam comportamentos e funções diferenciadas se coligaram em uma independência, criando um todo com individualidade própria.
Como exemplo, podemos citar alguns animais marinhos como água-viva e a medusa. Neles, encontramos três animais distintos, em simbiose, um servindo para percepção, outro para locomoção e outro para digestão, formando um todo que caracteriza outro animal (globalidade).
De acordo com o exposto, se observarmos a natureza, poderemos deparar com espécies que sofreram diferentes graus de evolução, demonstrando o poder de adequação de suas estruturas, inclusive nós, seres humanos.
Entendemos, então, que este comportamento gregário, grupal e simbiótico não pode ser visto nem analisado como partes individuais, mas sim como funções independentes que expressam, em sua globalidade de seres, uma função maior própria, com objetivos existenciais definidos.
Nos seres humanos, a unificação de um indivíduo tem origem na função de dois organismos diferenciados (óvulo/espermatozóide), trazendo, cada um, uma ogiva genética de onde eclodem as polaridades que farão a síntese biológica de um novo ser. Esta síntese se desenvolve a partir do surgimento dos três folhetos embrionários: o ectoderma, o endoderma e o mesoderma.
Nesta seqüência curiosa e significativa, a compreensão dos projetos deste ser está contida no desenvolvimento embrionário onde continuará por toda a sua existência, demonstrando a repetição da filogênese pela ontogênese.
Uma das características das leis universais é a capacidade da existência em elaborar formas através de elementos mais simples criando sistemas mais complexos. O homem como produto histórico da configuração do Universo não foge à regra para construir sua própria forma, e também expressá-la em suas dimensões: biológica, psíquica e espiritual. Esta tríade guarda uma relação direta com o seu constructo biológico primário, que trás em si a idéia, a forma e a ação do estabelecimento humano.
Construção da forma
No período evolutivo dos seres vivos o DNA tornou possível o estabelecimento de formas adaptativas à dinâmica existencial, sem o qual, hoje, não seria possível a transmissão dos caracteres apreendidos.
Sob a forma de marcadores genéticos estruturais o DNA viabiliza o melhor desempenho (pregnância) no continuum evolutivo da forma humana.
Reconhecemos esses aspectos no homem quando na fusão espermatozóide/óvulo e no desenvolvimento das três camadas germinativas embrionárias, (ectoderma, endoderma e mesoderma).
Movidas geneticamente, através dos milhões de anos em evolução, estas camadas conduz ao surgimento de estruturas biológicas diferenciadas, mas, objetivadas para o sentido maior da unidade humana a construção do indivíduo como um todo. Sob esta síntese desenvolvemos uma forma de trabalho psicoterápico, que chamamos de Biossíntese Morfoanalítica: Gestalten Biológicas Existenciais.
Esta composição teórica objetiva uma prática que não se baseia unicamente nas tendências inscritas no organismo (os fatores genéticos), mas também, na intermediação dos fatores ambientais (os fatores epigenéticos), os quais são moldados pelas sensações e sentimentos que garantem o modo expressivo do Ser no mundo.
Esta inter-relação organismo-meio deve-se à capacidade perceptual oriunda da primeira camada embrionária, o Ectoderma, que é responsável pela construção dos órgãos dos sentidos, pele, cérebro, sistema nervoso e órgãos sexuais. Curiosamente, o fato de esta camada ser a primeira a ser formada, nos leva a entender que a instância primordial do organismo é perceber, sentir e transmitir as informações às outras estruturas a serem formadas. Isto dá a dimensão de proximidade e afastamento, através de processos sensoriais específicos a essa estrutura que, como função, leva à apreensão de uma realidade existencial expansora ou repressora das necessidades organísmicas.
As apreensões do mundo exterior sedimentam-se na camada mais profunda, o Endoderma, que digere e excreta as substâncias do mundo exterior, através dos órgãos viscerais do sistema digestório biologicamente configurado a partir dessa camada. Sua função não é só digerir o alimento bioquímico, mas também todos os processos emocionais que interferem na porção autonômica do sistema nervoso e digerir ou não as apreensões existenciais. A resultante desses procedimentos metabólicos é o impulsionamento da energia (bioquímica, psíquica e espiritual) que alimenta o dinamismo da camada intermediária às outras citadas, o Mesoderma. Esta camada, evidência a formação dos ossos, músculos, tendões, coração e circulação dos líquidos polarizados (sangue, linfa, hormônios, água e sais minerais) do organismo que são responsáveis pela afirmação e plasticidade expressiva do indivíduo para o mundo.
O encarar (facing, segundo Boadella, 1992) o meio e confrontar-se com este é, talvez, o maior ato de evolução da humanidade como espécie. Este ato por si só, demonstra como utilizamos nossos grandes ciclos biológicos (gestalten) em suas funções na manutenção de nossa existência: o ato de respirar (inspiração e expiração) e o ato de comer e excretar. Partindo-se da posição ereta, essas funções ditam o modo como operacionalizamos nossa existência. É importante salientar que estas três camadas trabalham de uma forma simbiótica na manutenção do equilíbrio homeostásico.
O ritmo acelerado da existência, o aumento da competitividade, a necessidade de níveis de aquisição e a dificuldade de alcançá-los põem o indivíduo em um estado permanente de excitação nervosa (stress) que, quando cronificado, conduz ao distress (o estabelecimento de atitudes e funções orgânicas compensatórias aos estímulos nocivos recebidos). Estas compensações interferem no ciclo de regulação do organismo (Kurt Goldstein, 1961) que oscila, constantemente, entre os estados de atividade e repouso, buscando a melhor forma.
A busca pelo entendimento de atitudes quer sejam, de aparência orgânica ou psico-comportamental, faz com que o conhecimento humano evolua sob as bases de postulados filosóficos, dos quais se originam ideologias e correntes abstraídas de uma realidade sempre circunstanciada pelo individual.
Compreendemos que ciência é conhecimento que, quando firmado e aceito, cria um paradigma que se adéqua às vertentes do pensamento em um meio sócio-cultural. Assim, a ciência evoluiu sedimentada na fragmentação da realidade em verdades distintas, tendo como base o Cientificismo Positivista Cartesiano, que deu origem ao conhecimento objetivo e exato e o Cientificismo Subjetivo Humanístico, que retrata as atitudes humanas através dos sentimentos e idéias caracterizadas por tradições culturais.
O êxito do positivismo na Europa contribuiu para o descaso do pensamento metafísico, divergindo dos princípios preconizados por Lamark, Darwin e Kant a respeito da natureza. Neste período se reivindicou a Psicologia, direitos de pertencer aos postulados científicos como os da Física, Química, Biologia, e Ciências experimentais. Os trabalhos de Stuart Mill reivindicam a Psicologia como ciência independente, em que a observação teria como objetivo descobrir leis em que os fenômenos da alma (espírito) geram uns aos outros, sem exclusão da dependência organísmica (matéria – corpo físico).
Procurando corresponder às expectativas da Psicologia como ciência em seu caráter vigente, surgiu a Gestalt Teoria que, ao mesmo tempo se contrapondo aos procedimentos positivistas e associacionistas, tenta aprofundar o psiquismo humano de uma forma original e simples. E isto foi possível através do estudo das sensações e imagens que constituem a espinha dorsal de seus procedimentos teóricos.
A Psicologia da Gestalt ou ainda a Psicologia da Forma deve o seu desenvolvimento aos alemães Ernest Mach, físico, e a C. Von Ehrenfels, filósofo e psicólogo, que através de seus escritos sobre as qualidades da forma, os quais continham observações a respeito de linhas melódicas, onde a forma particular de uma partitura é a qualidade irredutível à enumeração das partes que compõem a melodia. Nasceu então o que entendemos como globalização da forma - o todo é maior que a soma das partes.
A Gestalt Teoria tem ainda uma influência da fenomenologia, através de Franz Bretano, tido como o iniciador dos movimentos fenomenológicos, Husserl e Koffka. Estes movimentos influenciaram a filosofia existencial de Karl Jaspers e Martin Heidegger, repercutindo sobre as ciências psicológicas, modificando a relação terapeuta/paciente, por ter levado em conta as qualidades de contato entre ambos, estabelecendo uma nova abordagem terapêutica.
A Gestalt Teoria se impõe no domínio médico-patológico influenciando a chamada Medicina Psicossomática, de origem Européia, com Grodeck, e a Americana com Franz Alexander. Por seu caráter científico se orienta para a consideração dos equilíbrios e dos desequilíbrios globais do indivíduo (ciclo de regulação organísmica em sua totalidade psico-orgânica).
Sob esse prisma, é inconseqüente negar a globalização da ação organísmica no confronto com o meio – campo total – (interno e externo), considerando ainda de extrema importância o reconhecimento das sensações no campo existencial que determinam a melhor forma de ação do indivíduo. É de vital importância para os novos caminhos da Gestalt terapia e a psicologia contemporânea, um entendimento da melodia tocada por cada ser humano, sendo cada aspecto desta, simplesmente, uma nota em sua harmonia com a existência.
Dentro do processo existencial, não há estruturação corporal sem uma experiência direta, portanto, a noção de existência só acontece a partir da tomada de consciência corporificada dentro da experiência direta (Awereness).
A expressão da estrutura humana tem um sentido de organização, e este sentido evidencia-se a partir da noção implícita do caos, o que leva à necessidade de uma ordenação dos estímulos que chegam ao organismo, e que serão metabolizados para uma ordem expressiva.
Em Biossíntese Morfoanalítica: Gestalten biológicas existenciais, este fenômeno de ordenação, que entendemos como princípio de pregnância ou estruturação da forma ideal, pode ser observado desde o desenvolvimento embriológico, nos movimentos interativos das camadas embrionárias já citadas.
Todos os influxos do organismo materno interagem bioquimicamente nas necessidades embrionárias desenvolvidas em cada ciclo das aberturas das chaves genéticas do organismo em formação. Esta capacidade de se organizar é um processo intrínseco às leis universais, quando observamos a natureza do átomo que busca manter-se estável dentro de sua instabilidade estrutural na formação molecular.
Portanto esta propriedade é inerente e básica como núcleo organizador. Todo organismo vivente procura, através do estabelecimento de ordenação, a resposta que acomode o melhor desempenho funcional. Desta forma, nossos órgãos e suas funções desenvolvem um organograma seqüencial a partir dos valores das forças que são absorvidas pelo organismo. Estas forças nos impulsionam para padrões que podem ficar estratificados em camadas cristalizadas, impedindo outras possibilidades funcionais.
Este continuum de organização conduz ao surgimento de formas ideais entre protoplasma e matéria, e no plasma humano caminha para a “formatividade” pregnante à ação.
Após o nascimento, o ser humano continua a repetir o processo de seu desenvolvimento, tendo sempre como base os ciclos de regulação organísmica que impulsionam a existência em uma espiróide entre vida, existência e morte.
Todos os organismos viventes têm uma forma única no modo de se organizar, e nos seres humanos esta organização se faz através de um diálogo contínuo entre as necessidades naturais e os paradigmas da sociedade circundante, o que nada mais é do que a busca da individuação. Nesta busca, os indivíduos se amoldam em processos injuncionais que poderão impulsionar ou estagnar a criatividade – criar atividade – e a criação – criar ação – pelo fixar de ideais psicológicos.
O que é mais presente durante toda jornada informativa é a capacidade contínua de estruturar nossa forma durante a existência.
Nossa idéia de Self vai estar sempre de acordo com a nossa percepção do como agimos, mas não percebemos a atividade músculo-esquelético para fazê-la, ou seja, tornamo-nos autômatos dos nossos padrões de sentimentos e pensamentos.
Quando nossas percepções ditam que estamos defasados em nossos objetivos, mais uma vez é acionado o centro organizador, o qual sob esta tomada de consciência age como um desorganizador do pré-existente, para reorganizar novos conceitos de existência, repetindo-se assim as ações micromoleculares para o macrocosmo social. Esta percepção nos dá a condição de escolha, ao invés de sermos escolhidos. E a partir do reconhecimento das forças limitadoras e da facilitação de experimentos que possibilitem o aumento da flexibilidade criativa, se constrói a chave do processo terapêutico para reinstituir o fluxo da energia formativa. O ponto central é a experienciação, pela qual nos estruturamos e projetamos esta corporificação em nossa vida pessoal.
O ato terapêutico, com uma observação adequada, nas expressões do cliente como um todo associados ao discurso verbal contextualizado ou não, podem conduzir ao desvelamento das “chaves” biológicas que são cruciais para a detecção das interferências dissonantes ou resistências que interferem no ciclo de regulação organísmica.
O passo inicial para as pessoas começarem a se dar conta dos padrões dissonantes, que são elas mesmas em várias situações, conscientes ou inconscientes, é o facilitar a confabulação de experiências significativas dentro de suas existências. Isto se torna possível, tanto ao nível individual, como nos grupos terapêuticos, com o estabelecimento de vínculos de confiança na escuta e na fala.
A partir deste passo, começamos a elaborar os procedimentos somáticos de como configurarmos nossa atitude para expressarmos ao meio.
O psicoterapeuta conhecendo os vários estágios formativos deste universo que se encontra à sua frente (o cliente) estabelece uma relação de contato que desenvolve uma coerência capaz de viabilizar a ressonância e a consciência “awareness” por parte do cliente em reconhecer (conhecer novamente) os entraves entre pensamento e ação. Estes conflitos contribuíram para expressar comportamentos inadequados por parte do cliente em seus relacionamentos pessoais e em sua própria existência.
O ato conduz a uma desarrumação da forma presentificada, abrindo um maior espaço em um novo sentido para o surgimento de uma nova concepção da forma, uma nova ação (inovação) e um novo comportamento.
Alguns puristas em terapias com base gestáltica exageram “o como”, e evitam os porquês, entendendo que estes tenham conceituação analítica e fragmentadora da totalidade, dando caráter mais explicativo do que integrativo, mas, no entanto, utilizamos aqui uma máxima popular que diz: “todo o quê tem seu por que”. Daí a importância de se conscientizar, primeiro, “do quê” e o entendimento “do como” para executar a ação.
De uma maneira mais prática, podemos perguntar: “O que faço?” Para em seguida questionar: “Como faço?” E em uma terceira etapa se dar conta de como parar de fazer (retirada). Na quarta etapa: “O que acontece quando deixo de fazer?” (evitação). E como quinto elemento: fazer uma síntese das etapas anteriores, procurando estar na “awareness” da importância dessa experiência na minha vida como um todo, de que forma a utilizo, quais os ganhos e perdas neste tipo de ação. Segundo Naranjo:
La terapia gestáltica considera como fóbica gran parte de la conducta actual: organizada de tal forma que toda ella pueda parecer fluida, y sin embargo, se evita el verdadero contacto, se suprime la verdadera expressión. Más allá de las casi universales evitaciones del dolor, de la profundidad en el contacto y de la expresión, algunas de nuestras fobias son individuales y se relacionan con el desheredar ciertas funciones específicas que son parte de nuestro potencial.
La idea de iniciar la acción o la expresión tiene, por consiguinte, dos formas de aplicación técnica en la terapia gestáltica: uma universal y otra individual. Uma técnica universal es maximizar la iniciativa, correr riesgos y manifestar la expressión en palabras ou acciones. Una de aplicação individual es una “prescripcion” basada en un diagnóstico individual de algo en cuyo hacer la persona se verá forçada a superar su evitación.
Em Biossíntese Morfoanalítica: Gestalten Biológicas Existenciais, ao executar uma ação qualquer é necessário ter Vontade, mas por outro lado, a vontade não nasce do nada e sim de uma energia sutil conhecida por Pensamento.
O pensamento ou forma de pensamento precede a nossa existência, e só através deste, a consciência humana se configura. Portanto, os pensamentos que passam para nós não são nossos, mas sim de uma consciência coletiva universal.
A consciência seria nada mais do que a síntese das formas de pensamento que habitam (fixação de idéias) e atravessam nossas mentes dentro de uma determinada cultura.
A depender de como sentimos e elaboramos os pensamentos como nossos, passaremos a desenvolver tensões, vibrações eletromoleculares de nossa estrutura orgânica, nos dando um sentido de auto-identidade, específica a uma ação. Nasce a partir daí o que podemos entender como Desejo. Queremos, então, fazer “algo”, não importa o que seja, e a partir do nível elaborativo das “formas pensamento” que configuram o desejo, passamos a uma necessidade orgânica de “fechar”, concluir o desejo. (Ciclos de regulação Organismica)
Sob a ação do desejo que por sua vez configura-se em função da intensidade das ondas de pensamento, nosso organismo eleva o grau de excitação nos complexos densos e fluídos de nosso corpo (hormônios, líquidos, descargas elétricas, motilidade celular dos tecidos e acomodações ósseas). Neste estágio, nos resta duas opções, permanecer e não ir adiante, ou partir para a ação, e para isto é necessário que atue a Vontade.
Para movermos no mundo é necessário ter vontade, desde o movimento de um simples dedo, a tomar decisões mais complexas e objetivas, dentro de um contexto existencial, o empenho da vontade (Ação) pode mudar, muitas vezes, toda uma dinâmica de vida.
A vontade pode ser entendida como “algo” distinto, mas não afastado do corpo, pois as atividades deste dependem da predominância energética da vontade. Em essência, seguimos a energia incessante da fonte que jorra de nosso interior (Id grodeckiano, Eu centro, Self, Core), que nos direciona no mais puro sentido da natureza humana; só que entre o impulso de saída do nosso Eu centro, e a manifestação expressiva de nós (eu social) muitas interferências ocorrem, o que sob muitos aspectos psicológicos e específicos, nos distanciam das expressões e configurações mais originais do espírito, do corpo e do psiquismo.
Em cima destes pressupostos, podemos entender que todo o crescimento humano sempre foi e será permeado pela vontade, mas, no entanto, esta vontade, muitas vezes fica encoberta pelo ambiente sócio-cultural.
As ações reais ou realizações, nada mais são do que a materialização da energia da vontade, pois só podemos percebê-la através da consecução das ações.
Essa operacionalização depende de uma forma específica de ação a que chamamos vontade hábil.
Toda ação para ser concretizada decorre de um processo, o qual está permeado de dificuldades exteriores que podem ser entendidas como entidades vivas (Sub Personalidades ou Sub Eus) que tentam, dentro de suas possibilidades, intervir e bloquear a consecução dos objetivos propostos. Quando desenvolvemos através de treinamentos específicos o surgimento da vontade hábil, conseguimos vencer, habilmente, todas as interferências que ameaçam a consecução dos objetivos firmados. Nós temos a capacidade de escolher, livremente, nossas ações, mantendo toda responsabilidade desta escolha.
Este poder de decisão que evolui e se desenvolve com a espécie humana, é o que é chamado de centro da vontade.
Em alguns momentos de nossa vida, nos sentimos como um barco à deriva. Não se vê a margem, isto é, não se reconhecem às metas e, estas quando são conhecidas não se sabe como alcançá-las.
No campo psicológico, isto significa a necessidade de se ter consciência das interferências produzidas por hábitos estereotipados, suas funções e inter-relações, de modo que possamos traçar as ações mais concretas para a execução das nossas metas.
Em algumas situações, a vontade (necessidade) surge com força e habilidade, muitas vezes ela não é satisfatória, e a sua direção não objetiva metas que visem ao crescimento individual ou o bem comum, pois esta pode estar dirigida para a maldade e tornar-se um grande risco para a comunidade, sociedade e humanidade. Podendo ser também utilizada para promover a “peste emocional”, corrompendo a vontade de outras pessoas e desconsiderando princípios éticos, distorcendo verdades em função de objetivos psicopatológicos.
Quando a vontade como necessidade entra em ação, ela deve ser forte, hábil e acima de tudo boa. Estes aspectos devem ser a meta de qualquer empresa, instituição ou pessoa humana que ocupam um lugar na sociedade.
Existe ainda outro aspecto de que muitas vezes nossa individualidade não se dá conta, mas que, de maneira consciente ou inconsciente, permeia os outros três: é à vontade transpessoal. Este é o quarto fator dimensional da existência humana, e que muitas vezes foi olhado com resistência pelos meios científicos, e que era domínio do campo religioso e da espiritualidade. Esta dimensão funciona no sentido ascendente, na busca da compreensão divina, que é inerente ao homem conhecida como transcendência, que visa à busca de valores supremos, experiências culminantes, transes e sensações místicas, bem-aventurança, auto-realização interior e a expansão do EU pessoal na busca do sagrado durante o cotidiano. Busca ainda um maior relacionamento entre a fusão do Eu pessoal com o sentido divino através da expansão deste Eu fundindo-se com o Eu cósmico que é a vontade transcendental.
O trabalho em Biossíntese Morfoanalítica aguça a nossa sensibilidade fazendo com que tomemos consciência da parte mais elemental e característica do nosso ser, a consciência do nosso Eu, o núcleo da nossa existência que tem uma natureza completamente diferente de todos os elementos (sensações físicas, sentimentos, pensamentos, processos emocionais...) que formam a nossa personalidade, agindo como centro unificador regendo estes elementos e guiando-os para a unidade de uma totalidade orgânica.
O organismo humano (corpo)
Uma Gestalt Biológica tem por base a estruturação de movimentos e posturas, os quais provocam o despertar de uma nova consciência (Awareness) em que o individuo dar-se conta de novas possibilidades e atitudes que proporcionaram escolhas mais eficazes dentro de seus processos existenciais.
Esta base foi ampliada levando-se em conta o principio elementar da contratibilidade biológica em resposta aos vários níveis de percepção. Entendemos que a principal via expressiva do ser humano são as respostas neuromusculares e viscerais alimentadas por conceitos individuais, que a depender do tipo de resposta expressiva, seu tempo e intermitência, poderá ser criado uma deformação postural e comportamental. Isto se dá por encurtamento (contração crônica), ou flacidez (perder tonicidade), da musculatura em geral. Deve-se levar em conta que a priori a musculatura esquelética posterior é principalmente atingida, e por conseqüência interfere em nossa forma estrutural que está diretamente ligada ao como fazemos e interagimos, diante do mundo que nos cerca, assim a nossa forma se expressa no nosso comportamento e vice-versa.
Outro princípio inerente às formas vivas é a tendência atualizante na busca da melhor forma e melhor adaptação às diversas situações fenomenológicas existenciais. Enquanto seres humanos este princípio de pregnância estará presente em nós tanto em latência como em potência no buscar de uma configuração simétrica equalizadora dos opostos.
Os opostos, vida e morte fazem parte de um processo global e específico. Global por fazer parte da existência como um todo e específico quando enfoca momentos existenciais.
Portanto devemos tomar consciência que viver é um processo de caminharmos para a morte e, durante esta jornada, nos deparamos várias vezes com a possibilidade da finitude. Quando adoecemos tomamos atitudes de risco em nossos ritos de passagem e nas “mortes vivas”, o nosso modo de interagir nestes momentos de crise é evidenciado pelas “marcas” expostas em nossas atitudes.
O nosso corpo é parte de um sistema integrativo onde todos os fluxos e influxos se interpõem e interdependem mutuamente (simbiose) todo tempo. Desta forma a terapia morfoanalítica não é um método de alívio, mas uma transformação concomitante da estrutura interna e externa facilitada por uma atitude não-diretiva por parte do profissional. Isto não quer dizer uma isenção, pois todo o processo é um acordo dentro dos limites de contato determinado pelo paciente, que tem liberdade de recuar ou avançar.
A tomada de consciência por parte do cliente o conduz a enfrentar seu próprio sentimento e o profissional ter ouvidos para captar os subentendidos, estando consciente que não se modifica impunemente uma estrutura corporal. Para tanto é necessário um bom contato com suas próprias emoções para não bloquear as dos outros.
Esta percepção por parte do psicoterapeuta quer seja um processo de grupo ou individual, não o faz um simples observador, mas antes de tudo um experenciador congruente consigo mesmo e com o outro, em uma globalidade no dar-se conta de como podemos mudar a nós mesmos.
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